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CRÍTICA | Pecadores é "terror" que gostaria de ser musical

Atualizado: 10 de jul.


Pecadores (2025)

Pecadores (2025), novo filme de Ryan Coogler, é uma obra que, apesar de ser vendida como um terror de vampiros, carrega em seu âmago um drama musical poderoso e uma das declarações mais poéticas e incisivas sobre liberdade, identidade negra e espiritualidade já feitas atualmente.


Ambientado no sul dos Estados Unidos dos anos 1930, a trama segue dois irmãos gêmeos afro-americanos, interpretados por Michael B. Jordan, que retornam à cidade natal com o sonho de abrir um clube de blues. No entanto, o que encontram é um território tomado por ameaças vivas e sobrenaturais: membros do Ku Klux Klan e vampiros. A partir dessa premissa, a narrativa se desenrola como uma fábula política e espiritual sobre o que significa a busca por liberdade.


Liberdade como centro narrativo


Apesar da roupagem fantástica, o que Pecadores (2025) de fato nos apresenta é um ensaio dramático sobre liberdade: a liberdade negada, desejada, buscada, conquistada — seja pelo dinheiro, pela espiritualidade, pela arte, pela música, ou pela dor. O filme nos coloca diante de personagens pretos que buscam, cada um à sua maneira, fugir das amarras que os limitam. Há quem veja a salvação no lucro, quem veja na fé, na irmandade ou no som do blues como voz de libertação.


Vampiros irlandeses em Pecadores
Foto: Reprodução/Warner Bros Entertainment

A inserção de vampiros irlandeses é uma metáfora fortíssima. Os vampiros não são o verdadeiro vilão, eles tem seus objetivos, dores e conexões. Em uma das cenas, um vampiro ora junto ao protagonista e ali, naquele gesto, somos atravessados pela compreensão de que o mal é estrutural, é social. Está no sistema, está no silêncio, está na culpa, está no próprio lar.


O que incomoda na introdução dos vampiros é como o terror relacionado a eles simplesmente parece correr do roteiro, como se fosse uma outra história tentando ser encaixada, como um fragmento adicional e não homogêneo. Apesar da premissa maravilhosa, é apenas um elemento que agrega bem, ao contrário do que o filme vende.


Direção e estética


Ryan Coogler entrega um filme de condução afiada. Há uma sensibilidade na maneira como ele escolhe onde a câmera repousa, o que é dito com a luz, e o que é calado no olhar dos personagens. As cenas musicais são, sem dúvida, o ponto mais alto da direção. São momentos em que o filme abandona qualquer tentativa de entretenimento fácil e se entrega ao que tem de mais precioso: a alma negra pulsando em forma de blues.


Michael B. Jordan em Pecadores
Foto: Reprodução/Warner Bros Entertainment

Por isso mesmo, talvez o maior conflito do filme esteja em sua tentativa de se encaixar em um gênero que não o comporta. Vendido como um terror de vampiros, Pecadores (2025) se aproxima mais do drama e os aspectos do horror acabam sendo quebrados com o fator comédia (inserido de forma excessiva). Quando o longa tenta recorrer ao gore ou à ação, especialmente em cenas mais forçadas — talvez por carregar o nome de Michael B. Jordan —, o filme perde potência. As sequências de ação desconectadas do drama parecem colocadas como obrigação, e não como parte orgânica da narrativa.


Trilha sonora e musicalidade


A trilha sonora é um espetáculo à parte. Misturando blues tradicional com batidas contemporâneas, o filme transforma cada número musical em um rito, uma forma de resistência, de memória e de futuro. A música, mais do que ambientar, narra. Ela cura, denuncia, exalta. E é nesses momentos que Pecadores (2025) atinge o sublime, ultrapassando o convencional.


Casal de Pecadores
Foto: Reprodução/Warner Bros Entertainment

Conclusão


Pecadores (2025) não é um longa sobre vampiros. É uma obra sobre vidas que foram historicamente drenadas e que ainda assim cantam. Sobre corpos que carregam memórias ruins, mas que também carregam o dom da criação, da reinvenção e da cura. É uma carta aberta sobre a negritude nos EUA e em qualquer lugar onde a liberdade ainda seja privilégio.


Cena da igreja em Pecadores
Foto: Reprodução/Warner Bros Entertainment

O filme talvez incomode quem espera sustos ou batalhas épicas, mas acolhe com força e beleza quem enxerga nas entrelinhas — ou no escancarado — a mensagem maior: a luta do povo preto não é só por sobrevivência, é por liberdade. E Pecadores (2025) sabe disso.


Nota: 4/5🩸


1 comentário


Rebeca
04 de jul.

Honra de chamar de chamar de amiga a pessoinha inteligentíssima que escreveu esse texto! Grande filme, grande análise

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