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CRÍTICA | A Mémoria Infinita é sobre não esquecer das pessoas que amamos

Atualizado: 8 de jun. de 2024



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Durante a segunda metade do século XX, diferentes países do Caribe, América Central e América do Sul tiveram experiências ditatoriais comandadas pelas forças militares de cada estado. No Chile, a história não foi diferente. Em 1973, a ditadura militar chilena começa e o país é liderado pelo general Augusto Pinochet. Com o fim da democracia, um período de repressão, censura e morte se instaurou durante 15 anos, gerando traumas e outras feridas que, ainda, não conseguem fechar.


Em “A Memória Infinita”, acompanhamos os últimos anos de um dos homens que mais lutou contra o regime. Augusto Góngora, é um jornalista chileno aposentado que é diagnosticado com Alzheimer e resolve, junto da esposa Paulina Urrutia, gravar o cotidiano do casal ao lidar com a doença. Neste documentário, o homem que sempre esteve de prontidão para cumprir o seu papel de comunicador, agora vê as câmeras registrando outras facetas em sua última missão, contar a própria história.


Como protagoniza o documentário, é importante entender quem foi Augusto Góngora.


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Divulgação/ MTV Documentary Films

Augusto José Góngora Labbé foi um jornalista, documentarista e apresentador de televisão chileno. Durante sua carreira, participou de diversos projetos audiovisuais, foi responsável pela área cultural da Televisión Nacional de Chile durante as décadas de 1990 e 2000 e foi membro de seu conselho de administração entre 2016 e 2017.


No entanto, a grande contribuição de Augusto para a história da comunicação foi durante a ditadura militar, onde participou de meios de comunicação de oposição ao regime. Foi editor da revista Solidaridad, revista que abordava acontecimentos ocorridos durante a ditadura de Augusto Pinochet que não foram noticiados pela imprensa controlada pelo regime.


Posteriormente, Góngora integrou a equipe do telejornal clandestino Teleanálise, onde atuou como editor geral entre 1984 e 1986 e como diretor entre 1986 e 1989. O telejornal captava acontecimentos relevantes através de uma abordagem não oficial, e com base em depoimentos de protagonistas e testemunhas, diante da censura imposta aos meios de comunicação pela ditadura. Por isso, tinha um caráter ilegal, o que era mostrado no início de cada programa com a frase “É proibida a transmissão pública no Chile”.


A história pode ser de Augusto, mas sem Paulina Marcela Urrutia Fernández, o impacto não seria o mesmo. Paulie, como é chamada durante a película, é uma atriz, acadêmica, diretora, dirigente sindical e política chilena. Foi ministra presidente do Conselho Nacional da Cultura e das Artes durante o primeiro Governo da Presidente Michelle Bachelet entre 2006 e 2010.


É ela quem se encarrega de contar ao público sobre quem é Augusto Góngora. No entanto, a relação de amor e carinho entre os dois sobrepõe qualquer curiosidade sobre a identidade de ambos (sem ofuscar, é claro) e adiciona novas camadas. Essa também é a história dela, de uma mulher que sofreu com a perda de um amor.


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Divulgação/ MTV Documentary Films

A direção de Maite Alberdi explora a angústia e a tristeza gerada pela condição de Augusto da forma mais humana possível. É uma história melancólica que não se permite ser influenciada pela doença e manchar a história do casal com uma abordagem mórbida. Muito pelo contrário, já que é transposto na tela toda a identidade daquele homem que lutou durante anos, sem deixar de lado os momentos alegres e sem esconder as dificuldades e crises da doença.


Identidade e memória são as duas palavras chave para entender o objetivo de registrar a dor daqueles que amamos, enquanto o tempo passa e a vida vai retirando um pouco dessa pessoa especial até o momento que a partida já parece inevitável e só resta aceitar e aproveitar a presença. Por diversos momentos, inclusive, é nítido enxergar o sofrimento de Paulina ao cuidar de Augusto. Desde o choro por não ser reconhecida ao sorriso sincero em um almoço.


Uma avó, uma mãe, um marido e até um filho. A perda de qualquer um que se ama deixa marcas que, muitas vezes, são incuráveis. A jornada depois disso passa longe de “superar”. Na verdade, o caminho certo seria o de preservar as memórias daqueles que já se foram. Afinal, amores verdadeiros não acabam com a morte. Só, e somente, quando são esquecidos.


“A Memória Infinita” é doloroso e reconfortante na mesma medida. Uma experiência que põe o espectador no papel de conhecer um homem que venceu a ditadura chilena e agora luta contra si mesmo, enquanto o tempo se esvai cada vez mais. Por outro lado, conhecer Augusto também é conhecer Paulina e o amor de ambos que continua e continuará, independente da frágil limitação humana chamada de morte. No final, o trabalho proposto é cumprido e a memória, sem dúvidas, será infinita.


É muito importante reconstituir a memória. Não para ficarmos ancorados ao passado, porque pensamos que, reconstituir a memória é sempre um ato voltado para o futuro. É sempre uma tentativa de ver a si mesmo, conhecer os problemas e nossas fragilidades, para sermos capazes de superá-los e poder enfrentar generosamente o futuro - Augusto Góngora

Nota: 4/5





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