A Força é feminina: Relembre as três personagens icônicas de Star Wars
- Ana Letícia
- 6 de mai. de 2024
- 5 min de leitura
Atualizado: 8 de jun. de 2024

Ao pensarmos em princesas, nos é atribuída inicialmente as ideias bucólicas de contos de fadas em quais essas mulheres são vistas como donzelas que cantam e dançam com pássaros e outros animaizinhos, e estão à espera do seu herói – ideias tão propagadas em mídias clássicas da Disney, por exemplo. Quando a personagem de Carrie Fisher surge em Uma Nova Esperança (1997), entretanto, parte desse estereótipo é rompido, abrindo espaço para uma presença feminina nunca vista antes em um universo tão dominado pela masculinidade.
Esperança
Apesar da primeira saga de Star Wars seguir a jornada do herói Luke Skywalker, a presença da princesa Leia Organa é tratada com muita relevância do início ao fim da trama, desde as cenas iniciais, nas quais são introduzidas ao público uma mulher corajosa e que não parece hesitar em meio às injustiças, assumindo uma posição que se destoava à de personagens femininas em filmes hollywoodianos no período, nos quais eram mais comuns ver mulheres representando uma figura materna, uma donzela em apuros ou um interesse amoroso dos protagonistas. Leia era uma heroína nessa narrativa, se equiparando e até mesmo superando a relevância dos outros personagens masculinos da trilogia.

Reprodução/ Disney Plus/ LucasFilms
É claro que nem tudo são flores: não é como se Leia não tivesse sido submetida à algumas escolhas de roteiro que flertavam com o voyeurismo masculino no período: quem não lembra do icônico biquíni de metal que a princesa usou ao ser escrava de Jabba, o Hutt? Ou até mesmo, da estranha relação com Luke, antes de saberem a verdade? Até mesmo o romance com Han Solo pode ser interpretado de outras maneiras hoje em dia.
Mas, mesmo com tudo isso, Leia se tornou um ícone imprescindível da cultura pop: seu penteado, suas roupas, seu carisma e determinação ajudaram a construir a imagem de Leia como símbolo de uma resistência que vai além da abordada na odisséia de George Lucas, que inspirou gerações de meninas que puderam se sentir parte da odisséia espacial, e segue conquistando o coração de milhares de pessoas, que vêem em Leia um ideal de liderança, inteligência e compaixão.
Liderança
Enquanto Leia desafiou os estereótipos associados à imagem de “princesa”, sua mãe por vezes caía neles. Na trilogia seguinte de Star Wars, lançada entre 1999 a 2005, uma nova personagem feminina é apresentada ao público: Padmé Amidala.

Reprodução/ Disney Plus/ LucasFilms
Assim como a princesa Leia, Padmé também representou uma figura diplomata que questionava o sistema e lutava por soluções pacíficas na galáxia – possuía coragem para desafiar a Federação do Comércio, se infiltrar em missões arriscadas e pôr em risco a própria vida em prol da luta pela liberdade do seu povo.
No entanto, apesar disso tudo, parte de sua trajetória na trilogia “prequel” de Star Wars é construída voltada a ser o par de Anakin Skywalker, então uma situação romântica naquele contexto (diferentemente da imposta à Leia) era justificada, até porque, era um dos pontos centrais da narrativa. Padmé exerce o papel de personagem rebelde que luta pela justiça de seu povo, mas que também vive um romance condenado com o já problemático Anakin – e que faz até com que muitos pensem que o erro do até então jedi foi “amar demais”.
Em consequência, Padmé era uma figura mais romântica que Leia, ilustrando o arquétipo de figura materna, que preza pelo zelo e pelo cuidado, fosse também reforçado na personagem durante a trama, até porque, ela seria a mãe dos Skywalker. E não há nada de errado nisso.
Padmé representou a diplomata que antecipava – caso estivesse assistindo à franquia na ordem cronológica – sua herança na filha Leia. Amidala tinha uma face mais idealista, compassiva e romântica, enquanto Leia era um tanto mais sarcástica, determinada e esperançosa, por assim dizer. É correto afirmar que ambas foram responsáveis por firmar uma presença feminina forte na franquia que foi repassada por inúmeras outras personagens no universo canônico e multifacetado da saga. Mas, no que diz respeito aos filmes, ainda falamos de Rey.
Despertar
Diferentemente das personagens Leia e Padmé, que mesmo com a sua presença óbvia e importante na franquia ainda eram consideradas como coadjuvantes ao núcleo dos centrais Luke e Anakin, a jornada de Rey comanda a última trilogia de Star Wars.
É importante destacar que a personagem de Rey surge em um período um tanto tenso no mundinho cinematográfico: havia uma grande demanda de atrizes exigindo equidade salarial, o que tornava a pauta de igualdade de gênero e feminismo muito debatida na mídia. Uma mulher ocupando um lugar historicamente dominado por personagens masculinos na mais famosa franquia de ficção-científica definitivamente seria uma forma de desafiar e gerar ainda mais visibilidade para a discussão – e como incomodou.

Reprodução/ Disney Plus/ LucasFilms
"Despertar da Força (2015)" nos introduz a Rey, uma personagem que mora em um ambiente um tanto hostil, é de origem humilde, adaptável, autodidata, independente e solitária, com nenhuma das características remetendo às outras personagens femininas da franquia, nos apresentando uma faceta duplamente disruptiva – 1, por não ser um homem na posição de destaque e 2, por ainda ser uma mulher e não se equiparar com Leia ou Padmé, que tiveram uma criação mais nobre e estavam em posição de poder.
Sua origem mais humilde, ainda que solitária, lembrava mais a de Luke Skywalker, e, nos anos que seguiram o desenvolvimento da trama da sequel esse foi o principal questionamento: se Rey era, ou não era uma Skywalker, ou filha de outro personagem mais relevante na franquia, como o Obi-Wan e até mesmo a própria Leia Organa. Se de um lado muitas das teorias eram lógicas e buscavam justificar a razão de Rey possuir a Força, havia também quem defendia a ideia de que a personagem não precisava ter um vínculo com nenhum outro portador da Força. Em ambos os casos, havia argumentos que buscaram enfraquecer a presença da personagem na narrativa, mesmo que a mesma fosse a protagonista.
E é fato também que as escolhas do enredo da última trilogia não agradaram a todos. Havia um apelo cansativo à nostalgia de personagens clássicos da franquia que era justificada pela “admiração” de Rey, além de uma estranha relação de cumplicidade e, ainda, romântica que Rey possuiu com o vilão Kylo Ren. A abordagem do “trio” dessa trilogia também parecia distante da heroína, diferentemente dos trios Luke, Leia e Han e Anakin, Padmé e Obi-Wan. Todas essas características (e muitas outras) levaram à descentralização da figura de Rey como protagonista da própria trilogia, e, logo, dando ao público a sensação que a história da personagem (infelizmente) foi mal planejada – diferentemente de Leia e Padmé, que tiveram desenvolvimentos mais coesos.
Ascensão
Não temos dúvidas de que o marco que surgiu com Leia Organa em 1977 tenha sido de muita importância para a formação de um legado que continuou com Padmé, Rey e muitas outras personagens femininas não citadas neste texto, inseridas no imenso universo de Star Wars. Este legado representa gerações de mulheres corajosas, que inspiraram luta, poder, justiça e força.

Ainda que haja muitas ressalvas, que o machismo não tenha acabado e que ainda é muito complicado pensar em representatividade feminina no mundo geek tendo em vista também o crescimento da comunidade de incels nos últimos anos, personagens como Leia, Padmé e Rey fazem a gente acreditar que há, sim, esperança numa galáxia não tão distante de nós.
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