Sucesso na internet, professora concorre ao prêmio de afroliteratura ‘Erê Dendê’
- Artur Soares
- 6 de jul.
- 4 min de leitura
Atualizado: 10 de jul.

Autores de literatura infantojuvenil de todo o país estão na corrida por uma conquista mais do que simbólica. A votação popular para o Prêmio Nacional de Afroliteratura Infantojuvenil Erê Dendê encerra hoje (6) e pode ser feita por meio do site oficial. O prêmio é dedicado à valorização da produção literária negra. Uma das concorrentes é a professora e escritora Lavínia Rocha, que se tornou sucesso nas redes sociais por conta de sua didática descontraída e temáticas afrocentradas.
O Erê Dendê vai premiar 10 obras, sendo nove delas escolhidas por um júri e a última sendo eleita por votação popular. Cada selecionado ganha o valor de R$ 20 mil. A professora destacou a importância da existência desse incentivo para os autores. “É fundamental existir um prêmio desses porque você valoriza as publicações já feitas pensados para a educação afrocentrada e estimula mais ainda a ter produções assim”, disse Lavínia Rocha em entrevista ao Moqueka.

Lavínia é autora do livro ‘Entre, Corra e Pule: Aventuras (Nada) Virtuais Pela África’, um dos concorrentes na categoria popular. Lançada em 2023, a obra aborda a história de dois irmãos que acabam sendo teletransportados para um videogame sobre civilizações africanas. “Eu queria muito trazer para esse livro, de uma forma divertida, aquilo que eu trabalho em sala. Eu selecionei algumas civilizações para retratar no livro de forma criativa e divertida, para que as crianças possam se divertir enquanto elas leem”, afirmou.
O livro não traz apenas uma visão lúdica sobre o continente africano, como também aborda os males da tecnologia. Um dos temas do livro é como a nova geração está cada vez mais dependente do mundo digital. “Eu quis trazer um pouco sobre isso, de como a gente tem ficado viciado e como temos a dificuldade de se abrir a novas coisas por achar que só aquilo é válido, só aquela conexão, aquele jogo online”, detalhou.
Apesar do Erê Dendê ser uma forma de fomento a uma escrita afrocentrada, Lavínia ressalta que esse tipo de literatura ainda enfrenta muitos desafios. Em sua opinião, um dos maiores obstáculos que esse tipo de obra encara é a ideia de ser “algo nichado”. “A gente vê pelos números, pelas vendas, a diferença com que tratam a literatura que tem protagonistas negros e como os best-sellers sempre estão dentro do padrão, desse ‘cânone literário’, que geralmente é branco”, completou.

Além de estar concorrendo ao prêmio literário, Lavínia também está em processo de divulgação de seu novo livro. Lançado em abril deste ano, “O Que Você Pensa Quando Eu Falo África?” é inspirado no vídeo da professora que fez ela viralizar nas redes sociais. No vídeo, ela apresenta aos alunos coisas positivas relacionadas ao continente africano e que eles desconheciam. “Os dois livros tem um pouco essa ideia de descolonizar nossa mente, trazer um pouco sobre nossa legado, nossa história, de forma divertida”, pontuou.
Destinada à literatura
Com um sorriso encantador e uma alegria que parece não ter fim, Lavínia Rocha consegue encantar até mesmo quem não é aluno. Nascida em Belo Horizonte, começou a despertar seu interesse pela escrita ainda cedo, durante as aulas de produção textual na escola. Aos 13 anos, publicou seu primeiro romance, intitulado “Um Amor em Barcelona”, que ainda carregava muitas referências eurocêntricas.
“Eu brinco que meus 2 primeiros livros são uma versão da Lavínia bem colonizada. Meu sonho era conhecer Barcelona e até as personagens principais dos livros eram brancas. Era bem diferente do que eu via no espelho, mas era o que eu queria ser. Se você pega a escrita de ‘Um Amor em Barcelona’ e compara com minha escrita de hoje, você vai ver como meu texto se tornou muito mais político”
Aos 17 anos, começou a adotar uma postura mais politizada, engajando em lutas dos movimentos negro e feminista. Atualmente dando aula para classes do ensino fundamental, ela acredita que é importante levar uma educação mais afrocentrada para as crianças desde cedo. “É super importante que desde pequenininho eles tenham essa referência. Eu vejo que quanto mais cedo entrarmos nesses assuntos, lá na frente faz uma diferença danada”, afirmou.
Apesar de ser filha de professora, só veio a exercer a profissão em 2022. O desejo por ensinar existiu na infância, mas ela só veio ter certeza que queria seguir na área depois que começou a realizar palestras como escritora dentro das escolas. “Isso me ajudou a perceber que a educação básica era um lugar muito confortável, prazeroso e onde eu acho que encontraria felicidade”, explicou.

Foi dentro da sala de aula que sua vida se transformou. Sempre apostando em uma didática divertida e descontraída, um dia a professora decidiu gravar sua interação com os alunos. Após perguntar “o que você pensa quando eu falo África?” e receber uma série de respostas negativas, ela mostrou as riquezas do continente africano para os estudantes. O vídeo viralizou e garantiu a ela o prêmio de educadora mais criativa do país.
Depois de tudo isso, Lavínia Rocha se tornou uma referência no que diz respeito a produção de conteúdo literário e educação antiracista. Como em uma teoria do destino, desde sua infância a pequena mineira parecia estar destinada a estar conectada com a literatura. “É muito estranho, engraçado e ao mesmo tempo maravilhoso pensar que um hobby, uma brincadeirinha de criança, se transformou em uma carreira, uma carreira que me ajuda a pagar as contas”, afirmou.