CRÍTICA | O HOMEM DOS SONHOS é como uma noite mal dormida
- Alan Pinheiro
- 28 de mar. de 2024
- 3 min de leitura
Atualizado: 8 de jun. de 2024

Sonho. Conjunto de imagens, de pensamentos ou de fantasias que se apresentam à mente durante o sono, mas também ideia ou ideal dominante que alguém ou um grupo busca com interesse ou paixão. Essas duas definições da palavra sonho, apesar de parecerem remeter a coisas completamente diferentes, são unidas a um único propósito em O Homem dos Sonhos (Dream Scenario, no original) para contar uma história sobre ascensão e queda.
Com roteiro e direção de Kristoffer Borgli, a trama acompanha Paul Matthews (Nicolas Cage), um infeliz pai de família e professor universitário que vê sua vida virar de cabeça para baixo quando milhões de estranhos começam a vê-lo em seus sonhos. Quando suas aparições noturnas tomam um rumo de pesadelo, Paul é forçado a lidar com seu novo estrelato.
A produção do filme fica por conta de Ari Aster, diretor de Hereditário, Midsommar e Beau tem medo. De cara, percebe-se facilmente a influência do americano na estética do longa, muito por conta das similaridades com o clima de desconforto presente nos outros trabalhos do cineasta. No entanto, são nas sequências de sonhos, um dos pontos altos do filme, que o envolvimento de Ari Aster realmente surte efeito.

Quando o texto te leva para fora da realidade, um mar de possibilidades se abre. Dentro dessa perspectiva, duas representações do imaginário são exploradas. Primeiramente, os sonhos como narrativas desconexas e sem linhas de raciocínio. Em seguida, os pesadelos. Há um momento chave do filme que representa essa cisão e está diretamente condicionada ao personagem principal, brilhantemente interpretado por Nicholas Cage.
Inclusive, por falar em Nicolas Kim Coppola, o astro de 60 anos é definitivamente o melhor aspecto dentro da produção. Estigmatizado pela grande presença em filmes considerados como fracasso em críticas, Cage chega ao seu ápice ao dar vida a um personagem que espelha a sua própria trajetória como ator. Nicholas e Paul são subestimados, mas ambos sabem de seus potenciais e têm a ambição de querer mais. Porém, a semelhança acaba quando a jornada de ambos seguem caminhos paralelos. Quanto maior a queda do professor, maior é a ascensão do ator.
A premissa da obra, que está sendo vendida pela distribuidora como uma comédia de terror, se inspira em uma lenda urbana da internet que surgiu em 2006. “Você já sonhou com este homem?”. Segundo o mito, um dos pacientes de uma psiquiatra de Nova Iorque estava tendo sonhos recorrentes com o mesmo homem. Essa pessoa teria desenhado o rosto dessa figura e mostrado para a profissional, que deixou em cima de sua mesa até outro paciente o reconhecer.

A partir disso, o longa desenrola uma trama que toca em temas como imagem pública, crise de imagem e cultura do cancelamento. No entanto, o que estava se construindo para se tornar uma produção diferente do habitual no gênero, acaba deixando-se contagiar pela personalidade ambiciosa do protagonista. Ao esquecer da lógica de que “menos é mais”, a mensagem é distorcida, permitindo que haja uma brecha gravíssima sobre a interpretação do que é mostrado em tela.
Paul é um homem que nunca recebeu muita atenção em sua vida, por isso, é empolgante para ele quando as pessoas começam a procurá-lo. Essa era a chance de usar a repercussão de sua imagem para se autopromover e conseguir conquistar seus sonhos, mas a sua mulher, interpretada por Julianne Nicholson, desconfia a todo momento que a história não acabará bem.
E é justamente nesse “não acabar bem” que o roteiro se perde. Existem muitos excessos dentro de O Homem dos Sonhos que prejudicam a experiência. O primeiro deles está relacionado com a estrutura do filme. A construção da piada funciona até o momento que se torna repetitiva, o que se assemelha a uma situação de contar a mesma novidade duas vezes para uma única pessoa. O impacto se perde e cria-se o sentimento de que a duração poderia ser menor. O mesmo acontece quando a comédia é substituída pelo horror.

Já em relação ao todo, o que mais me incomodou foram os 10 minutos finais. Terminando mais cedo, a finalização seria perfeita e deixaria um “bom” gosto amargo. No entanto, o que se sucede nesses minutos é um terrível desfecho que decide criticar tudo e todos sem ter espaço para tal. Quando o personagem do Michael Cera aparece, realmente há a construção de temas ao redor da internet, mas a mercantilização intelectual não recebe destaque maior do que uma piada “Black Mirror”.
No fim, O Homem dos Sonhos tem uma premissa muito promissora que é elevada pela atuação ímpar de Nicholas Cage, mas a falta de polimento dos excessos em relação ao roteiro prejudica a experiência por completo.
Nota: 3/5 💭
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